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N/A HOUSE E SUA POTÊNCIA VIRTUAL

Foto do escritor: BARDI FAUDBARDI FAUD

_Paola Serafim Filócomo


"É definido por Sou Fujimoto como ninho, o local onde a forma como o arquiteto usa o corpo como elemento primordial em seu processo, permite extrair do universo os signos que vão construir os espaços e trazer sentido à arquitetura.

Trata-se de uma condição prática e existencial. O ato somático é a transformação da imagem de um corpo expandindo a afetividade positiva que garante a vida. O conhecimento somático fundamenta o conhecimento cognitivo na conexão com o entorno. A afetividade garante o processo de emergir junto: corpo, mente, ambiente."

EICHEMBERG e GREINER (2020, s/p)


Em sua obra, Fujimoto trabalha tanto o conceito de ninho, que não é nada além do que o estabelecimento de um espaço, no qual as funções são facilmente reconhecidas e geram certo sentido de conforto, quanto o de “caverna”, que provoca uma espécie de deslocamento, como se estivéssemos percorrendo toda a história da arquitetura, em busca do espaço mais primitivo já habitado em toda a humanidade. Para Fujimoto, esta caverna é o local mais antigo possível já frequentado pelo homem. Este recinto não tem outro desenho a não ser as ranhuras naturais da pedra, que do ponto de vista arquitetônico, quando passam a ser administradas pelo corpo, tornam-se espaços. Quando o corpo está cansado, o mesmo buraco pode se tornar uma cama, uma mesa, diante de um corpo faminto ou mesmo uma fogueira, quando há um corpo com frio presente. Essa combinação com o corpo cria um espaço, que não é mais considerado apenas uma grandeza física, mas uma potência virtual que pode ser renovada em infinitas possibilidades.


Quando entendemos o conceito de Fujimoto de que "espaço é relacionamento", e a origem da arquitetura parte da "distância" e do "espaço entre as coisas", essa percepção nos permite entender os diferentes graus de interação entre pessoas e objetos. Portanto, a diversidade do espaço e da matéria se desenvolve, dissolvendo as fronteiras entre corpo e espaço e dissolvendo essas categorias em um único diagrama espaço-corpóreo, ou seja, se manifestam duplamente um devir espaço do corpo e um devir corpo do espaço. No entanto, é importante lembrar que quando o corpo captura o espaço por meio de suas ações sobre o mundo e seus desejos sobre as coisas, essa fronteira tende a desaparecer, criando novos contornos, delineando formas que não estão dadas no primeiro momento, mas a partir dessa relação são geradas. Assim, a arquitetura de Fujimoto propõe traços que só podem ser completados quando ocupadas pelo corpo. Este é o significado de "caverna": permitir ao corpo ocupar o mundo por si mesmo e impregnar a matéria com seu contorno. (EICHEMBERG e GREINER, 2020)


O processo descrito de incorporação entre homem e meio, é o que acontece em espaços dinâmicos, flexíveis a receber novas funções conforme a necessidade do usuário, como a N/A House. Prevê-se que ao longo do tempo, essa interação gere modificações e apropriações do espaço, consolidando determinados usos e afeições de acordo com as percepções e diálogos estabelecidos entre o usuário e o lugar. Esta habitação, inaugurada em 2010, foi projetada para um jovem casal e seu interior é composto por 21 placas individuais, dispostas em alturas variadas remetendo ao conceito de viver em uma árvore, criando “entre-espaços”. Assim, o desejo do usuário de usufruir de sua própria casa como nômade, é atendido.


Projetada pelo escritório Sou Fujimoto Archtects, a casa, com área construída de 84,91m², está localizada em um bairro tranquilo de Tóquio e se difere dos muros de concreto comumente encontrados na maioria das densas áreas residenciais do Japão devido à sua característica de translucidez. Estando dentro da casa, é possível observar o entorno com imensa facilidade, pois a maioria da residência é vedada por vidro transparente e sua estrutura é de aço branco com pequena espessura e piso de placas de bétula branco apoiadas nos pequenos vãos do projeto.


Sou Fujimoto citou que “O ponto intrigante de uma árvore é que esses lugares não são hermeticamente isolados, mas conectados uns aos outros em sua relatividade única. Ouvir a voz de alguém de cima para baixo, pular para outro galho e conversar entre ramos diferentes. Esses são alguns dos momentos de riqueza encontrados em uma vida espacialmente densa”. A área das placas de piso varia de 1,95 m² quadrados a 7,52 m² e cada uma delas é composta por variedades de curtos lances de escadas e plataformas, fixas e móveis. A estrutura propicia diversos tipos de funções, como proporcionar espaço habitacional, circulação e áreas de trabalho, pois sua escala é de mobiliário, o que permite que o habitante se aproprie do espaço da maneira que necessitar. Caracterizada como uma “unidade de divisão e coerência”, a casa atua como um único cômodo e uma coleção de cômodos simultaneamente. O programa vagamente definido e as placas de piso individuais criam um ambiente para uma série de atividades que podem ocorrer em diferentes escalas. (MARQUEZ, 2012)


N/A House


Diagrama conceitual

Este arquiteto tem seu trabalho embasado na perspectiva japonesa, onde a tríade corpo-mente-ambiente é considerada um sistema aberto e impermanente. Deste ponto de vista, entende-se que a construção arquitetônica não está separada do corpo, há uma troca, um fluxo, entre cada um desses elementos para trazer sentido à arquitetura. A espacialidade compõe-se de uma relação co-evolutiva entre corpos e espaços, que se constituem mutuamente. Assim, o espaço não pertence à esfera do “fora” e nem a subjetividade está intrínseca ao sujeito, pois o fluxo entre dentro e fora que constitui a relação “entre” (onde encontra-se a espacialidade) não permite que estes componentes se apartem. Apesar de cada uma das esferas possuir suas características próprias, o projeto arquitetônico, segundo as pesquisas de Fujimoto, seria "resultante de um processo que parte, primeiramente, do entendimento do espaço enquanto potência virtual e, posteriormente, da arquitetura enquanto uma atualização da presença do corpo que informa, qualifica e manifesta suas interações." (EICHEMBERG e GREINER 2020, s/p)


Essas interações, para Fujimoto, são provenientes do corpo que se percebe como integrante do espaço onde se produz uma rede de pré-disposições perceptuais, motoras, de aprendizado e emocionais. Portanto, o contato com o ambiente pode promover a transformação do corpo em diferentes níveis, ou seja, assim como o corpo muda o meio por interferência, também é modificado por ele. Por um lado, se o edifício "se funde" no corpo em seu processo, também abre um caminho para o corpo "se vestir" do espaço. Em outras palavras, aqui podemos dizer que a arquitetura só se manifesta no momento em que o corpo se faz de sua membrana, sua pele e sua superfície de contato no mundo. Embora o sujeito que frequenta muitos lugares seja o mesmo, o dentro do corpo tem suas especificidades relativas às características do organismo e o fora também, de acordo com condições climáticas, dimensões e modos de ocupação, por isso há diferença entre os ambientes. (EICHEMBERG e GREINER, 2020)


É assim que os ambientes da N/A House apresentam multiplicidade. Este é o projeto de um arquiteto que partiu de uma interessante metáfora, "Viver em uma casa é como morar em uma árvore" (FUJIMOTO, 2014), partindo da exploração de diagramas. A possibilidade que esta estrutura de rede sugere é que as pessoas encontrem um novo sistema de coordenadas neste espaço cheio de caos e elementos incertos. Talvez seu aspecto mais interessante seja a possibilidade de "suspender" a vida, que propõe uma nova natureza ocupante do espaço e que liberta o corpo da estabilidade e do repouso. A N/A House propõe um espaço instigante ao corpo móvel que oscila e flutua entre essas superfícies, no seu ímpeto curioso.


N/A House


Corte




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